segunda-feira, 10 de julho de 2017

Escritor do mês | julho

DAVID MACHADO

(1978 - )


"A literatura, para mim, é um texto que, não dando respostas, levanta questões"
David Machado

David Machado nasceu em Lisboa em 1978. É licenciado em Economia pelo Instituto Superior de Economia e Gestão, de Lisboa, mas acabou por trocar os números pelas letras. 

Publicou os romances O Fabuloso Teatro do Gigante, Deixem Falar as Pedras, Índice Médio de Felicidade (Prémio da União Europeia para a Literatura 2015, Prémio Salerno Libro d’Europa 2016) e Debaixo da Pele. Publicou, além disso, vários contos para crianças, entre eles, A Noite dos Animais Inventados (Prémio Branquinho da Fonseca 2005), O Tubarão na Banheira (Prémio Autor SPA/RTP 2010 de Melhor Livro Infantojuvenil), A Mala Assombrada, Parece Um Pássaro, Eu Acredito, Uma Noite Caiu Uma Estrela e Os Livros do Rei.

Os seus livros estão publicados em mais de uma dezena de línguas. Traduziu os livros O Herói das Mulheres, de Adolfo Bioy Casares, e Obrigada pelo Lume, de Mario Benedetti.

O seu conto A Noite Repetida do Comandante foi escolhido para figurar no Best European Fiction 2017, da editora americana Dalkey Archive e está entre 29 contos escritos por autores de toda a Europa, que foram selecionados para a edição deste ano.  

Antes de mais, repara, Almodôvar, tu não estavas cá.
As coisas ficaram muito difíceis muito depressa. Ou talvez tenha sido sempre assim, talvez o mundo tenha sido sempre um lugar complicado. Não creio que tenha começado quando foste preso, ainda que, de alguma forma, isso me pareça o início de tudo. E a tua ausência reforçou as nossas dores, a tua decisão de não quereres ver ninguém teve consequências. O que é o mesmo que dizer: não estávamos preparados para não te ter aqui. Deixaste demasiado espaço vazio e nenhum de nós sabia muito bem mover-se na amplitude desse abandono. (…)
Eu teria percebido. Se me tivesses recebido quando te fui visitar, se tivesses atendido os meus telefonemas, teríamos falado, ter-me-ias explicado tudo e eu teria compreendido, Almodôvar, ter-te-ia poupado aos relatos cá fora, o teu filho, a Clara, o Xavier, eu, as angústias de pessoas de quem gostas, este país deitado por terra, o mundo inteiro a ruir, não diria nada até te encontrar preparado para ouvires tudo, para saberes e sentires tudo. Teria esperado para te contar que, três meses depois de seres preso, fiquei sem emprego, que pouco depois disso a Marta, desempregada há quase meio ano, se foi embora com os miúdos para Viana do Castelo trabalhar no café do pai dela, eu fiquei porque ainda acreditava.

David Machado, Índice Médio de Felicidade, p.11-13






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